sexta-feira, 30 de agosto de 2019

CPI da Síndica



Ninguém gostava da síndica ranzinza. Ainda mais quando descobriram que o vigia da noite estava ganhando quase o mesmo que a pensão de Dona Marlene do 7º andar.

- Que humilhação para uma viúva de Almirante!

 - Pessoal, calma! Aqui estão contabilizados o adicional noturno dele, pagamento de feriado. É justo que...

- Aff... São muitos direitos!

- Daqui a pouco, eles vão querer  ter carro também!

- Ele já tem!!! Um Elba 92!

- E estaciona numa das vagas do dono misterioso do tríplex, sabia?

- Gente, vamos voltar pra reunião! – Tentou em vão o secretário. A revolta já imperava.

- Temos que mudar tudo isso que tá aí, tá ok? – Gritou o ex-policial que costumava ir às reuniões armado.

A antiga administração adorou, lembrou a época que o prédio era só dela.  Resolveu se unir ao policial e analisar as contas.  Descobriram que a verba para construir a churrasqueira no play, a síndica usou pra consertar a parte hidráulica que vazava pra garagem.

- Fez isso porque o vazamento era na vaga do tríplex. O amigo dela.

- Olha, meu querido. Nem quem conhece o dono do tríplex sabe se o tríplex é do dono ou não é do dono. Porque se o dono é o dono, o tríplex tem dono. Mas se o tríplex tiver outro dono, o dono não é o dono. O dono é o outro dono –explicou a síndica.

Enquanto isso, o advogado que morava no bloco B, Dr. Serginho, encaminhava pra o grupo do condomínio um meme mostrando que o dono misterioso do tríplex, na verdade, era o pai da síndica.

Resultado: síndica destituída do cargo. “Bota o policial mesmo, depois a gente vê o que faz”. Vigia demitido. A economia com o salário dele passa ser destinada à construção da sonhada churrasqueira.

Festa de inauguração com bebida liberada marcada.

- Gente e a parte de hidráulica? Vamos resolver? – ponderou o agora ex- secretário.

- Mi mi mi.

- Viúva da síndica!!!

- Vai morar no condomínio do lado esquerdo da rua!!!

Inauguração

A festa estava um sucesso.

- Separa o filé aí do meu filho, tá ok? Ahahahha

Logo depois da administração fazer o pratinho, a parte hidráulica estourou de vez. Play todo alagado! Fim do churrasco. “O ex-secretário também ficou torcendo contra”. Deu tempo ainda de uma brasa do carvão molhado queimar as samambaias do jardim.  Mas pra isso ninguém ligou. Só o casal de veganos do bloco B. “Chatooooss”

Restava abrir uma cervejinha e relaxar. Outra surpresa. A bebida havia sido roubada. Afinal, não havia mais vigia à noite.

Oito meses depois
Os moradores reclamam agora da taxa-extra para as reformas urgentes da parte hidráulica. A administração pede que nesse meio tempo os condôminos usem o banheiro dia sim, dia não. As crianças pedem pra deixar tudo como está (o play alagado deu uma ótima piscina). E o ex-vigia apareceu bêbado (talvez seja a cerveja que sumiu) exigindo os direitos trabalhistas, que provavelmente serão pagos com mais um prolongamento da taxa-extra.

- Eu não disse que eram muitos direitos!?

CIRCULAR
“A Administração do Condomínio Nossa Senhora dos Cabelos Encaracolados convoca Assembleia Extraordinária a fim de demonstrar como as balbúrdias praticadas pelos jovens do bloco C (C de Cuba) danificaram a parte hidráulica. Contaremos com a apresentação em Power Point do sobrinho do Dr. Sérgio, esse sim, um menino de bem.
Atenciosamente,
Johnny Bravo”

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

“São os motivos mais bestas que causam as grandes tragédias.” MELIKIAN, VARTAN in blogspot mesmo , 2019.

Sendo sincero, não sei se frase é verdadeira. Mas como vai cair como uma luva na minha crônica, vou manter a sentença. Tudo pelo texto.

A semana começou ainda com a briga pelo setor Sul do Maracanã. Uma questão de honra que quase termina em tragédia fora do estádio e que terminou catástrofe dentro no campo. O Fluminense perder mais uma vez para o Vasco e com gol sem querer, pra mim, é catástrofe sim.

Ontem, outro exemplo. Agora comigo. Atravessando distraído a ciclovia, quase sou atropelado. No susto, soltei um palavrão. Levanto a mão pra desculpar minha distração, mas nem deu tempo. O ciclista furioso me xinga. Aí, mexeu com minha honra. Fiz a mesma cara de mau que faço pra meu filho quando ele não almoça direito. Não deu certo, ele parou e me encarou. Nesse momento, me senti defendendo o lado Sul do Maracanã. Finquei ali na ciclovia. Ele também não gostou e veio à minha direção. Já comecei a me alongar para a briga no próximo parágrafo.
- Você é valente? Diz aí...
Ia responder meio que zeca pagodeiramente: “Não sou valente, mas não também peço arrego”.
- Não sou valente não, mas... – mas engoli seco o resto da frase. Ele era amigo do Godzilla. O mostro veio também. Vestia uma camisa colada do UFC e uma mochila de Jiu Jitsu. Olhava pra mim como se fosse me mastigar.   
Já imaginei meu óbito com o Godzilla segurando minhas pernas e me batendo de um lado para o outro no chão.
Só um detalhe: também tenho amigos. Não ia apanhar sozinho. Mas Rodrigo Viannini é um sábio. Também... Já foi tudo na vida: fisioterapeuta, jogador de futebol, engenheiro em Dubai, pescador em Búzios, serviçal do narcotráfico, pastor evangélico, astrofísico e deputado pelo Acre. Parece que agora virou juiz de paz.
- Rapaz, meu amigo te pediu desculpa e você xingou ele por quê? – disse calmamente.
- Meu Deus, ele me pediu desculpas!? Então eu que me desculpo aqui. Foi mal, estou com a cabeça quente, cara...
Apertei as mãos dos dois (ou eu estou com artrose nos dedos ou o Godzilla ainda guardava uma certa mágoa quando me cumprimentou). O que importa é que o ciclista estava sorridente, eu aliviado.
Aprendi a lição do título. Então, nem vou rebater os áudios do Rodrigo pelo What’sApp me dando mais esporro do que o Bolsonaro no Bebianno.
  

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

CRÔNICA RAP - Brasil (de) novo




- Ei, Maria do Açaí? Não a encontrei ali. E você nem aí
- Patrimônio não declarado. Você já deixou de lado.
- Empresas bancaram campanha. Você até curtiu a artimanha.
- Vieram o Onyx e o caixa 2. “Ele já se desculpou, ora pois”.
- De carona, o motorista Queiroz. “Aff, parece que torce contra nós!!!”
- O COAF não pode mais falar. “Ah, deixa isso pra lá”.
- Nosso dinheiro pra mudar cor de cadeira. Isso é gestão financeira?
- Fica Marun. Apoia Maia. Todos da mesma laia.
- Genro de Leo Pinheiro manda na Caixa. Adivinha quem vai pagar mais taxa?
- De novo Onyx. Agora com notas fiscais. “Pô, deixa o homem trabalhar em paz!”
- Lacrou nas redes sociais? Vai pro gabinete da presidência. 13 mil reais
- E Filho do Mourão? Agora ganha quase 40 mil. Meritocracia lá no Banco do Brasil.

Afinal, o país está mudando ou quem mudou foi você?

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

Futebol Moderno

O moleque estava nervoso. A partida ia começar.

 - Pai, estou esperando este jogo desde que eu estava com 7 anos.

Ele fez 8, há 4 dias.

Eu também era assim com futebol. Tão vidrado que tomei uma madura decisão aos 12 anos. “Escutar jogo pela rádio é angustiante, quando tiver um filho, ele vai comigo a todos os jogos no Maracanã”.

Agora que ele está adorando futebol, chegou a hora de cumprir a promessa.

- Vai se arrumar que te levo ao jogo.

- Obaaaa!!  Vamos pra Madrid!?!?!?

E então veio a expressão simbólica de como ainda estou preso na década de 80:

- Cuma!?!?! (Mocó, Didi – Vida e Obra)  

Ele é PSG. O jogo seria entre Real Madrid e o time de “Neymito”. Ele nem sabe qual campeonato o Fluminense está jogando, nem o motivo de não existir mais o Maracanã. Do Flamengo, ele falou que se lembra só do Muralha e riu.  O deboche ainda me deu uma esperança.

- E na escola? Gabriel é tricolor ou flamenguista?

- É Barça! Laurinha é Real, Arthur é Juventus e João Pedro é PSG também. Igual a mim.

O jogo começou e ele dizia o nome de todos os jogadores. Pronunciava melhor do que eu.
Via o jogo e me dei conta que finalmente estava assistindo a futebol. Isso despertou uma sensação que agora só com análise pra eu entender. Enquanto xingava os dirigentes ridículos por terem acabado com o futebol daqui, agradecia a concorrência desleal do futebol europeu e ao vício terrível dos joguinhos de vídeo game por colocarem a paixão do esporte mais próxima a essas crianças.

Minha única raiva que agora em vez de  ir ao Maracanã terei que dar um jeito de desembolsar muito mais para algum dia ir ao Parc des Princes e cumprir a promessa.


OBS: Quando o Marcelo fez terceiro gol do Real Madrid, os olhos de Daniel se encheram d’água.

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

É só uma letra.


Cansada de me ver com as camisas que compro sempre do mesmo camelô em frente ao Campo São Bento, minha mulher resolveu dar um basta nisso. Foi ao camelô do lado e comprou uma camisa estampada com a letra de uma música do Cazuza.

“Enquanto houver burguesia, não vai haver poesia”.

Achei linda. Se eu fosse ao Rock’n Rio, iria com ela. Como não fui, usei pra ir ao Hortifruti mesmo. E em menos de 2 horas, minha camisa causou mais polêmica do que exposição contendo homem nu.

Um amigo, um familiar, o vizinho do outro bloco e um taxista parado no sinal me recriminaram.

O taxista abriu a janela, me olhou de cima e baixo, e proferiu a sentença: “Zezé DiCamargo neles!”.

O vizinho do outro bloco me perguntou se eu dava tanta atenção à causa proletária, por que nunca havia assinado o livro de ouro dos porteiros. Por sorte, o elevador chegou.

Um familiar me chamou de subversivo. E meu amigo, vidrado em Wikipedia, leu a camisa e descreveu etimologicamente o termo burguesia. Tintim por tintim. No fim, um lembrete: você é burguês também, sabia?

Tentei descontrair o papo e citei outro trecho da música “Eu também cheiro mal”.

Mas ele nem riu. Tentei me defender.

- Sim, sei que sou burguês. Inclusive se eu estivesse na Revolução Francesa, no dia da queda da bastilha eu iria lá pra frente fazer a dança do Neymar.

Ele só respondeu que Neymar nem era dessa época. E continuou me olhando com expressão de nada.

Só me restou tentar explicar o contexto maior do termo burguês nessa música e em alguns discursos. Mas descobri que o meu amigo não sabe o que é licença poética. Bem, assim, não tem mesmo como haver poesia.


Tudo isso só pra dizer que eles não entendem muito de arte não.

sexta-feira, 26 de maio de 2017

A malemolência do futebol brasileiro


Com o itinerário militar, quartel-Brasília-quartel, darei meia volta volver nos meus temas. Passarei a falar mais sobre futebol. Sou um ser prudente.

Contundido por uma bolada de papel,
Serra foi vetado para a partida. Mas
apareceu para dar o pontapé inicial
Imaginei uma grande partida no Maracanã, que como todos sabem é da Odebrecht (e de um pouquinho do Eike também).

O homem de preto é Gilmar Mendes. É um juiz lento, burocrático, mas parceirão dos jogadores. De alguns, mais ainda. Ele apita o início da partida. O ensaboado Aécio divide uma bola e “FALTA!!” para o Aécio. A torcida vibra:

 - AHHH - É C-I-O. 

Ele novamente recebe a bola e... Tropeça sozinho. “FALTA!!”.

 Aécio espirra. “FALTA!!”.

Uma espécie de Eurico Miranda genérico, o cartola Jairzinho Bolsonaro não se aguenta. Invade o campo. Xinga o juiz. A mãe do juiz. Fala que futebol não é jogo pra mulherzinha. Se não quebrar ou torturar o adversário, “NÃO-É-FALTA!”.  

- Juiz ladrão tem que ser fuzilado!

A violenta torcida organizada aplaude e grita "Uh! Vai Morrer”.

Dilmão pedala mal e perde o gol.
Enquanto isso, um jogador de origem humilde, língua presa e linguagem popular (queria estar falando do Romário, mas o nome dele é Lula mesmo), avança pela esquerda. Na verdade, pela direita também, dependendo do ângulo. Ah, enfim, avança pelo centro, vai. Ele faz umas firulas e entrega a bola para a centroavante Dilmão, que pedala na frente do goleiro e...  Fuuuura a bola.

Jogada tão ruim que o bandeirinha Dudu Cunha marca impedimento pelo conjunto da obra.

O técnico Temer resolve ousar. Aqui cabe uma explicação: Temer é o típico técnico de futebol. Tem esquemas com empresários pra escalar jogador, monta mal o time, fala bonito nas entrevistas, mas só faz merda. E dessa vez, ele quis dar um golpe de mestre. Resolveu que ele mesmo seria o substituto de Dilmão no ataque. 

No camarote vip, uma bela e recatada torcedora grita sozinha:

- Lindo, tesão bonito, gostosão!

Um minuto de silêncio constrangedor no Maracanã.

Temer enrolar-se-ia sozinho com suas pernas. E o gandula Rodrigo Maia tentava colocar o mais rápido possível pra jogo todas as bolas fora de Temer. No fim, já estava com aquela cara de choro de tão casando. Coitado.

Aécio pode ser julgado por fugir do antidoping.
O jogo vira uma zona. Perdendo mais uma vez, Aécio abandona a partida no meio, sem fazer sequer o antidoping. Saiu vaiado até pela Janaína, chefe da sua torcida. A arquibancada inteira briga. Um bandeirão vermelho é queimado, uma camisa da CBF novinha é rasgada. Um pecado (custa caro pra cacete). Sanduíches de mortadela são arremessados. Panelas voam e somem no ar. 
    
Mas o que importa é que a bilheteria é um enorme sucesso. Ingresso caro e muito fanatismo trazem renda recorde pra o Maracanã da Odebrecht e de um pouquinho do Eike também. Fato exaltado com muita vibração pela grande mídia:

- É rrrrrecorde!!!! É rrrrecorde!

E assim a transmissão se encerra com a narração do rei do microfone, ele, Joesley Batista.




sexta-feira, 17 de março de 2017

O Zé da história


Zé Lindoso sempre foi um homem de boa fé. Cresceu acreditando na frase do ex-ministro Delfim Neto. Era só esperar o bolo crescer pra depois repartir. Uma pena, porque justamente na hora da divisão, veio uma crise e o Brasil entrou numa hiperinflação. Que chato!

Você pode achar que Lindoso se abateu, mas se engana. Ele não pensou em crise e foi trabalhar. Ainda arrumou tempo para dar sua contribuição ao país. Virou um fiscal do Sarney.

Verdade que não deu muito certo... Mas o que vale é a luta. Zé Lindoso continuou trabalhando duro. “É só correr atrás que vão reconhecer o seu valor.” Mas chegou a onda dos marajás.  Lindoso já estava até ficando desconfiado do Brasil, do mundo... Quando surgiu.... Tchan-ran.... O Caçador de Marajás! A-há! Agora vai.

Não deu. Foi o dia da caça.

Mas calma, veio o Plano Real. Hora de fazer o bolo crescer de novo.  Só que usaram um fermento genérico, tal de privataria. O bolo ficou com cobertura de escândalos, acompanhado de compra de votos pra reeleição, etc. Assim não dá pra repartir. Paciência. “A culpa é do FHC”. Hora de uma limpeza!

Só o PT pra acabar com essa falta de ética. Agora é Lula contra os 300 picaretas com anel de doutor. “Olha, já até estão dividindo um pouquinho o bolo... Pera aí,  pera aí... Mensalão faz parte do bolo? Olha com quem o PT está de amizade. Com os picaretas!” Lindoso ficou chateado. “A culpa é do PT”. Hora de uma limpeza!

Lindoso chegou a se exaltar um pouco. Amassou a Tramontina, foi pra rua e aceitou que os picaretas voltassem. “Também deram problema, mas pelo menos têm um português melhor. Depois, a gente vê o que faz” 

Ele ficou feliz até com a nova gramática do Planalto e o novo Ministro da Fazenda. “Inclusive o Delfim apoia a nova política econômica, sabia?”. Estava aceitando razoavelmente tudo, até entrar essa história de Reforma da Previdência. Agora, Zé Lindoso pode não conseguir se aposentar (não teve como investir numa previdência privada. Sempre ganhou pouco. Ia fazer quando o bolo fosse dividido). Isso o deixou bem chateado. Resolveu ir diretamente a Brasília pra falar com o Temer.

Saiu de lá convencido. Se o presidente se aposentou aos 55 anos e tem que trabalhar até hoje, sinal que a aposentadoria não é uma coisa boa por aqui. Melhor trabalhar até os 80 e tentar melhorar o país.